ISSN 2674-8053

Brasil assume a presidência do Conselho de Segurança da ONU

ONU News/Divulgação

A partir de julho o Brasil assumirá a presidência rotativa do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU). Será o 11º mandato do Brasil à frente do Conselho de Segurança e ocorre num momento de muita tensão internacional.

Mas, afinal, qual o papel do Conselho de Segurança atual? Questionamentos sobre a reforma da ONU como um todo e do Conselho especificamente fazem sentido? Para responder a estas perguntas e entender o papel do Brasil no Conselho é preciso, antes, entender um pouco a ONU e seu papel no mundo.

A ONU foi criada após o fim da II Guerra Mundial e tinha como seu principal objetivo promover uma paz duradoura. Esforço semelhante foi feito ao final da I Guerra Mundial, com a criação da Liga das Nações, que não alcançou seu principal objetivo, já que a II Guerra Mundial começou 25 anos depois. Então, o que diferencia a ONU da Liga das Nações? Por que a ONU teve muito mais sucesso em garantir a paz do que a Liga das Nações?

Uma das principais explicações passa pelo Conselho de Segurança, quando buscamos uma perspectiva mais institucional. Na ONU existe a Assembleia Geral, que reúne todos os países-membros. Lá são discutidas todas as questões da ONU, buscando ser um espaço privilegiado para a construção de agendas comuns e o estabelecimento de cooperações internacionais, depois executadas no âmbito das dezenas de organizações que fazem parte daquilo que chamamos Sistema ONU.

O Conselho de Segurança, por sua vez, é o órgão responsável pela manutenção da segurança internacional. Por conta disto, os países que tomam parte no Conselho se reúnem para discutir problemas e questões que possam comprometer a paz mundial.

O Conselho é composto para 5 países permanentemente (China, Estados Unidos, Franca, Grã-Bretanha e Rússia) e mais 10 membros rotativos. Estes são selecionados pela Assembleia Geral sempre buscando uma distribuição geográfica equitativa para mandatos não-renováveis de 2 anos. Interessante notar que apenas os países permanentes têm o chamado poder de veto. Com isso, caso algum permanente seja contrário a uma resolução, se voto fará com que essa resolução não seja efetivada.

Os membros permanentes são os que detinham mais poder militar (leia-se atômico) ao final da II Guerra Mundial. Desde )ntão o mundo mudou muito e o papel da ONU como um todo começou a ser questionado. Formada por dezenas de organizações (como Unesco e Unicef, para citar duas bem conhecidas), a ONU foi responsável por levar importantes agendas internacionais para frente. No livro A Década das Conferências, de José Augusto Lindgren-Alves (https://funag.gov.br/biblioteca-nova/produto/1-256-decada_das_conferencias_1990_1999_a) há uma boa discussão sobre o tema. Muito dos atuais padrões mundiais foram, na verdade, construídos no âmbito do Sistema ONU.

No entanto, os questionamentos continuam, minando o papel central que a ONU desenvolveu ao longo das últimas 8 décadas. Existem diferentes propostas, como a busca pela construção de uma ordem internacional baseadas em leis (rules-based order – https://en.wikipedia.org/wiki/Liberal_international_order#:~:text=In%20international%20relations%2C%20the%20liberal,internationalism%20since%20the%20late%201940s). Trata-se de uma ordem internacional baseada no liberalismo e que é questionada por parte dos países, que discordam desta forma de organização mundial.

Outra proposta para uma nova estrutura do sistema internacional é aquela em que indica a criação de novas organizações mundiais (como o Fórum das Democracias), que teria o papel de promover agendas e indicar padrões internacionais que seriam aceitos mundo afora. Novamente, numa perspectiva liberal.

Interessante notar que ambas as propostas poderiam ter no Sistema das Nações Unidas seu espaço privilegiado de promoção, mas não é o que ocorre. A questão aqui é que dentro da ONU já se encontrou um equilíbrio entre os diversos interesses e as agendas internacionais são promovidas de uma forma mais lenta, sobretudo porque acaba respeitando mais os interesses diversos de seus membros. A busca por regras ou novas organizações foram da ONU é uma tentativa de impor visões de mundo de alguns sobre a complexidade e diversidade que encontramos no mundo atual.

E qual o papel do Brasil no Conselho de Segurança da ONU? Considerando todo esse questionamento sobre o papel da ONU, é fundamental que o Brasil assuma um papel de liderança na reafirmação do Conselho de Segurança como o espaço privilegiado para a condução das discussões sobre a segurança internacional. Criar regras e organizações paralelas ao que já existe acabará por prejudicar ainda mais as discussões e encaminhamentos em torno da paz. Mais do que criar novas esferas, o momento é de pensar como as atuais podem agir melhor.

Rodrigo Cintra
Pós-Doutor em Competitividade Territorial e Indústrias Criativas, pelo Dinâmia – Centro de Estudos da Mudança Socioeconómica, do Instituto Superior de Ciencias do Trabalho e da Empresa (ISCTE, Lisboa, Portugal). Doutor em Relações Internacionais pela Universidade de Brasília (2007). É Diretor Executivo do Mapa Mundi. ORCID https://orcid.org/0000-0003-1484-395X