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Táticas de poder: exercícios militares dos EUA em plataformas marítimas ricas em fósseis

Nos últimos anos, os Estados Unidos intensificaram suas operações militares em regiões marítimas ricas em fósseis, desencadeando um debate significativo sobre a legalidade e o impacto ambiental dessas atividades. A Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (CNUDM) de 1982, que estabelece um quadro jurídico para a utilização dos oceanos, incluindo a exploração e a conservação de seus recursos, tem sido uma referência central na discussão sobre a legitimidade dessas operações.

Em 2021, a Marinha dos EUA conduziu exercícios militares no Mar do Sul da China, uma região notoriamente rica em recursos fósseis, incluindo petróleo e gás natural. Estes exercícios foram criticados por diversos países da região, particularmente pela China, que reivindica grande parte do Mar do Sul da China como parte de seu território soberano. As manobras militares americanas envolveram o uso de porta-aviões, submarinos nucleares e aviões de combate, projetando poder militar em uma área disputada e potencialmente violando a soberania dos países vizinhos.

Um caso emblemático ocorreu em 2019, quando a Marinha dos EUA realizou operações no Golfo de Omã, outra área conhecida por suas vastas reservas de petróleo. Estas operações incluíram a simulação de ataques a instalações de extração de petróleo, o que gerou preocupações sobre possíveis danos ambientais e a perturbação das atividades econômicas locais. A presença militar dos EUA foi vista como uma demonstração de força destinada a proteger os interesses estratégicos e econômicos na região, mas também levantou questões sobre o respeito aos princípios da CNUDM.

A Convenção sobre o Direito do Mar de 1982 estabelece, entre outras coisas, a soberania dos Estados costeiros sobre sua zona econômica exclusiva (ZEE), que se estende até 200 milhas náuticas a partir da costa. Dentro desta zona, o Estado costeiro tem direitos exclusivos para explorar e utilizar os recursos naturais, incluindo os recursos minerais e fósseis. As atividades militares em ZEE de outros países podem ser vistas como uma violação desses direitos, especialmente se forem realizadas sem o consentimento do Estado costeiro.

Além dos casos mencionados, os exercícios militares dos EUA também têm ocorrido no Ártico, uma região rica em recursos fósseis devido ao derretimento das calotas polares. Em 2020, os EUA realizaram exercícios navais no Mar de Barents, próximo à costa da Rússia, uma área conhecida por suas reservas de petróleo e gás. Essas manobras militares foram vistas como uma tentativa de assegurar a liberdade de navegação em uma área cada vez mais acessível devido às mudanças climáticas, mas também levantaram preocupações sobre possíveis violações da soberania russa e os impactos ambientais das operações militares em um ecossistema frágil.

Os exercícios militares dos EUA em plataformas marítimas ricas em fósseis, além de questões de segurança nacional, têm implicações diretas para o meio ambiente e a soberania dos estados costeiros. A Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar foi projetada para equilibrar os interesses dos Estados costeiros e os direitos de passagem dos navios de guerra, mas as recentes atividades militares dos EUA sugerem uma tensão crescente entre esses princípios. A adesão estrita às disposições da CNUDM é crucial para evitar conflitos e proteger tanto os recursos naturais quanto os direitos soberanos dos Estados costeiros.

As operações militares dos EUA em regiões ricas em fósseis mostram uma clara interseção entre a projeção de poder militar e a exploração de recursos naturais estratégicos. Estas atividades destacam a necessidade de uma abordagem mais equilibrada e cooperativa na governança dos oceanos, que respeite tanto a segurança internacional quanto os direitos soberanos e ambientais dos Estados costeiros.

A observância dos regimes internacionais, como a Convenção sobre o Direito do Mar, é essencial para a manutenção da paz e da estabilidade global. O respeito por esses acordos multilaterais ajuda a prevenir o aumento de tensões internacionais, promovendo a cooperação e a resolução pacífica de disputas. Quando os países agem de acordo com as normas estabelecidas, reduzem-se as chances de conflitos militares e se fortalece a confiança mútua entre as nações. No contexto das operações militares em regiões ricas em recursos fósseis, seguir os princípios da CNUDM não só protege os interesses ambientais e econômicos, mas também serve como um meio vital de assegurar um ambiente internacional mais seguro e previsível.

As operações militares dos EUA em regiões ricas em fósseis mostram uma clara interseção entre a projeção de poder militar e a exploração de recursos naturais estratégicos. Estas atividades destacam a necessidade de uma abordagem mais equilibrada e cooperativa na governança dos oceanos, que respeite tanto a segurança internacional quanto os direitos soberanos e ambientais dos Estados costeiros.

Rodrigo Cintra
Pós-Doutor em Competitividade Territorial e Indústrias Criativas, pelo Dinâmia – Centro de Estudos da Mudança Socioeconómica, do Instituto Superior de Ciencias do Trabalho e da Empresa (ISCTE, Lisboa, Portugal). Doutor em Relações Internacionais pela Universidade de Brasília (2007). É Diretor Executivo do Mapa Mundi. ORCID https://orcid.org/0000-0003-1484-395X