
As perspectivas de paz na guerra entre Ucrânia e Rússia permanecem distantes, marcadas por agendas incompatíveis e exigências que, em muitos casos, inviabilizam qualquer avanço concreto nas negociações. Enquanto Moscou apresenta uma série de condições que consolidam ganhos territoriais e impõem limitações severas à soberania ucraniana, Kiev insiste em demandas que, embora moralmente compreensíveis, carecem de viabilidade prática no atual cenário geopolítico.
A proposta russa, formalizada em um memorando apresentado durante as negociações em Istambul, exige que a Ucrânia reconheça a anexação da Crimeia e das regiões de Donetsk, Lugansk, Zaporíjia e Jersón como parte integrante da Federação Russa. Além disso, Moscou demanda a retirada total das forças ucranianas dessas áreas, a neutralidade militar permanente de Kiev — excluindo qualquer possibilidade de adesão à OTAN —, a limitação do tamanho e do armamento das Forças Armadas ucranianas, a proibição de atividades nacionalistas e a oficialização da língua russa no país. Essas exigências, que equivalem a uma rendição disfarçada, são vistas por analistas como uma estratégia para transformar a Ucrânia em um Estado satélite, vulnerável à influência e ao controle russos.
Por outro lado, a posição ucraniana, liderada pelo presidente Volodymyr Zelensky, mantém-se inflexível quanto à integridade territorial do país. Kiev insiste na devolução de todos os territórios ocupados, incluindo a Crimeia, e na responsabilização da Rússia por crimes de guerra, como a deportação forçada de crianças ucranianas. Além disso, a Ucrânia exige garantias de segurança robustas e reparações pelos danos causados pela invasão. Embora essas demandas reflitam o desejo legítimo de justiça e soberania, elas se mostram pouco realistas diante da atual correlação de forças e da disposição limitada da comunidade internacional em confrontar diretamente Moscou.
A rigidez das exigências ucranianas, aliada à dependência contínua de apoio militar e financeiro ocidental, levanta questionamentos sobre a viabilidade de uma solução negociada. A recusa em considerar qualquer forma de concessão territorial ou de neutralidade estratégica pode prolongar o conflito indefinidamente, impondo custos humanos e materiais crescentes à população ucraniana. Além disso, a insistência em condições que a Rússia dificilmente aceitará pode ser interpretada como uma estratégia para manter o apoio internacional, mesmo que isso signifique adiar indefinidamente a paz.
Enquanto isso, a Rússia, embora responsável pela agressão inicial e por inúmeras violações do direito internacional, demonstra uma abordagem mais pragmática nas negociações. Ao propor um cessar-fogo temporário e a retomada gradual das relações diplomáticas e econômicas, Moscou busca consolidar seus ganhos territoriais e enfraquecer a resistência ucraniana sem recorrer a uma escalada militar total. Essa estratégia, embora cínica, pode ser mais eficaz em alcançar seus objetivos de longo prazo do que a postura intransigente de Kiev.
A comunidade internacional, por sua vez, enfrenta o desafio de equilibrar o apoio à soberania ucraniana com a necessidade de evitar uma escalada do conflito. A recente ameaça do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de impor sanções tanto à Rússia quanto à Ucrânia caso não haja progresso nas negociações, reflete a crescente impaciência com a falta de avanços concretos. Essa postura indica uma possível mudança na dinâmica do apoio ocidental, que pode pressionar Kiev a adotar uma abordagem mais flexível nas negociações.
As perspectivas de paz na guerra entre Ucrânia e Rússia permanecem sombrias, com ambas as partes mantendo posições rígidas e incompatíveis. Enquanto a Rússia busca consolidar seus ganhos e impor limitações à soberania ucraniana, Kiev insiste em demandas que, embora legítimas, carecem de viabilidade prática. A menos que haja uma mudança significativa nas abordagens de ambos os lados, o conflito tende a se prolongar, com consequências devastadoras para a Ucrânia e riscos crescentes para a estabilidade regional e global.
Pós-Doutor em Competitividade Territorial e Indústrias Criativas, pelo Dinâmia – Centro de Estudos da Mudança Socioeconómica, do Instituto Superior de Ciencias do Trabalho e da Empresa (ISCTE, Lisboa, Portugal). Doutor em Relações Internacionais pela Universidade de Brasília (2007). É Diretor Executivo do Mapa Mundi. ORCID https://orcid.org/0000-0003-1484-395X