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Os BRICS e a vacina da Covid-19, mais uma chance perdida

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A vacinação para o Covid-19 está avançando e o mundo começa a respirar aliviado, mas ele esconde uma realidade muito mais dura e desigual no mundo em que vivemos. O acesso às vacinas, bem como sua produção, é resultado de relações de poder que só reforçam a desigualdade que existe entre os países.

Assim que ficou claro o tamanho do problema com o Covid-19, os países mais ricos iniciaram seus esforços para produção de vacinas e para a compra ou bloqueio antecipado das vacinas a serem produzidas. Para se ter uma ideia, até o final de 2020 esses países já haviam garantido 3,8 bilhões de doses. A quantidade comprada por países como Estados Unidos e países europeus superavam largamente a sua população. Só os EUA, por exemplo, compraram vacinas que superavam 5 doses por habitante.

O que vemos de importante aqui é o poder econômico. Os países ricos tinham recursos (e vontade política) para conseguir comprar as vacinas. E usaram esse poder. Mas existiu outra possibilidade que perdemos. Atualmente, o desenvolvimento de vacinas é feito também em países em desenvolvimento. Para se ter uma ideia, atualmente temos 20 vacinas que têm se mostrado viáveis mundo afora. Destas, seis foram desenvolvidas na China, Índia e Rússia desenvolveram duas cada país. Ou seja, 50% das vacinas viáveis foram desenvolvidas por estes países.

China, Índia e Rússia têm capacidades produtoras ou de desenvolvimento tecnológico impressionantes nesse setor. O Brasil não é tão desenvolvido, mas tem potencial. O Instituto Butantan e a Bio-Manguinhos Fiocruz têm a capacidade de produção, além do potencial para serem centros de inovação mais impactantes. Ou seja, o Brasil não está ao lado daqueles países, mas poderia traçar planos para estar em uma ou duas décadas.

No âmbito dos BRIC essa vontade já é real, como ficou claro na 10ª Cúpula de Joanesburgo (realizada em 2018), quando foi decidida a criação do Centro de Pesquisas, Desenvolvimento e Inovações em Vacinas do BRICS.

As vacinas são feitas a partir de insumos farmacêuticos ativos, conhecidos como IFA. Algo que a pandemia trouxe à tona é que o mundo depende de China, Índia e Rússia para o fornecimento dos IFA. Dos BRIC, o único que está de fora disto é o Brasil. A crítica aqui não está no descomprometimento do governo federal brasileiro com relação à vacina, ainda que seja legítima. O que chama a atenção é que, mais uma vez, tínhamos nos BRIC um potencial importante de atuação, mas perdermos.

Se o Brasil apostasse nos BRIC como uma de suas principais estratégias de atuação internacional, teríamos o contato privilegiado para os fornecedores de IFA e, inclusive, para uma transferência de tecnologia rápida. Não nos esqueçamos que nos BRIC existe o Novo Banco de Desenvolvimento (NDB), sendo este um importante financiador de projetos como aqueles necessários para a produção dos IFA e das vacinas.

Rodrigo Cintra
Pós-Doutor em Competitividade Territorial e Indústrias Criativas, pelo Dinâmia – Centro de Estudos da Mudança Socioeconómica, do Instituto Superior de Ciencias do Trabalho e da Empresa (ISCTE, Lisboa, Portugal). Doutor em Relações Internacionais pela Universidade de Brasília (2007). É Diretor Executivo do Mapa Mundi. ORCID https://orcid.org/0000-0003-1484-395X