
Artigo elaborado por Ana Clara Barbosa Ferraz Dias e Marcella Bernardinelli Munari
Este artigo examina os principais desafios e perspectivas da adesão dos países dos Bálcãs Ocidentais à UE, analisando os critérios de Copenhague, as reformas exigidas, os benefícios esperados e as dificuldades enfrentadas pelos países candidatos, (bem como os interesses estratégicos da UE no processo). A abordagem utilizada na pesquisa é qualitativa e envolve a análise de bibliografias acadêmicas e matérias jornalísticas sobre a temática. Como objetivo geral, o artigo busca entender o funcionamento do processo de adesão à União Europeia, com o foco na atual tentativa de associação dos países da região dos Bálcãs ocidentais, exibindo seus desafios e perspectivas durante o processo, além de mostrar como está o andamento e qual dos países está mais próximo de ingressar no bloco.
Primeiramente, é necessário a compreensão do contexto histórico em que a região está inserida e a sua relação com a União Europeia diante desse cenário. A região dos Bálcãs Ocidentais tem desempenhado um papel geopolítico crucial na Europa pós-Guerra Fria. Após o colapso da Iugoslávia e os intensos conflitos étnicos e territoriais nos anos 1990, a reconstrução institucional e a estabilidade política tornaram-se prioridades para a comunidade internacional, especialmente para a União Europeia (UE) (Judt, 2005; Bieber, 2018). Diante disso, em 1999, a UE promoveu o Processo de Estabilização e de Associação (PEA), projeto que constitui em uma estrutura estratégica voltada para a gradual integração dos países dos Bálcãs Ocidentais à União Europeia. Essa estrutura se fundamenta em acordos bilaterais, apoio financeiro, diálogo político, intercâmbio comercial e promoção da cooperação regional (Parlamento Europeu, 2024). A partir da Cúpula de Salônica em 2003, a UE reafirmou seu compromisso com a integração desses países, estabelecendo condições rigorosas relacionadas ao Estado de Direito, democracia e reconciliação étnica (European Commission, 2003). Desde então, a região da ex-Iugoslávia e Albânia iniciaram processos diferenciados de adesão: enquanto a Eslovênia tornou-se membro da UE em 2004 e a Croácia em 2013, outros países permanecem em distintas fases de negociação, enfrentando desafios persistentes como corrupção, instabilidade política e tensões bilaterais (Tzifakis, 2012). Ainda assim, a perspectiva de integração europeia continua sendo um vetor fundamental de transformação institucional e desenvolvimento econômico na região (Elbasani, 2013).
O Tratado da União Europeia estabelece que qualquer país que deseje tornar-se membro deve respeitar os valores da democracia e dos direitos humanos (TUE, Art. 49), bem como os princípios da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (TUE, Art. 6º, §1). Nesse sentido, certos critérios devem ser cumpridos para a adesão. Esses critérios, conhecidos como critérios de Copenhague, foram estabelecidos pelo Conselho Europeu de Copenhague em 1993 e fortalecidos pelo Conselho Europeu de Madri em 1995. Esses critérios compreendem a estabilidade das instituições que garantem a democracia, o Estado de direito, os direitos humanos e a proteção das minorias; uma economia de mercado funcional e a capacidade de lidar com a pressão competitiva e as forças de mercado na UE; e a capacidade de assumir as obrigações da adesão, incluindo a capacidade de implementar eficazmente as regras, normas e políticas que constituem normas e políticas da UE e a adesão aos objetivos da união política, económica e monetária.
O processo de adesão à União Europeia é padronizado e rigoroso, aplicando-se igualmente a todos os países que solicitam entrada no bloco. O processo é dividido em três etapas principais. Na primeira etapa, o país interessado apresenta sua candidatura ao Conselho da União Europeia, que solicita à Comissão Europeia uma análise da capacidade do candidato em satisfazer os critérios de adesão, com base na qual o Conselho pode conceder o estatuto de país candidato, desde que haja unanimidade entre os Estados-Membros (Comissão Europeia, 2024). A segunda etapa consiste nas negociações de adesão, durante as quais o candidato deve alinhar sua legislação nacional ao acervo comunitário, ou seja, o conjunto de normas, políticas e princípios jurídicos da UE. A Comissão Europeia monitora continuamente o progresso das reformas exigidas e comunica seus relatórios ao Conselho e ao Parlamento Europeu (European Union, 2023). Por fim, na terceira etapa, após a conclusão das negociações, a Comissão emite um parecer final sobre a prontidão do país. Caso o parecer seja positivo, é elaborado um tratado de adesão, que precisa ser aprovado pela Comissão Europeia, pelo Conselho Europeu e pelo Parlamento Europeu, e posteriormente assinado e ratificado por todos os Estados-Membros e pelo país candidato (European Commission, 2024). Esse processo garante que a adesão ocorra de forma criteriosa e em conformidade com os valores fundamentais da União.
O processo de adesão à União Europeia nos países dos Bálcãs Ocidentais apresenta avanços assimétricos, refletindo os diferentes contextos políticos, institucionais e econômicos de cada Estado. Embora todos compartilhem a perspectiva de futura integração europeia, cada país encontra-se em estágio distinto no cumprimento dos critérios exigidos pela UE, como a estabilidade democrática, a adoção do acervo comunitário e o fortalecimento do Estado de Direito. Em 2024, a Comissão Europeia publicou o pacote anual de alargamento, que apresenta uma avaliação minuciosa da situação e dos progressos dos países que estão passando pelo processo de adesão (Comissão Europeia, 2024). A seguir, são analisadas individualmente as trajetórias de adesão dos países da ex-Iugoslávia e da Albânia, destacando os principais marcos, desafios e avanços registrados no âmbito das negociações e da preparação institucional.
A Albânia solicitou adesão à UE em abril de 2009, tornou-se país candidato em julho de 2014 e iniciou as negociações em março de 2020, com início formal apenas em outubro de 2024, priorizando temas como Estado de Direito e Direitos Fundamentais. Apesar dos avanços, o país ainda enfrenta obstáculos relacionados ao sistema judiciário e à corrupção, o que retarda o processo, já que a reforma institucional e o combate ao crime organizado são exigências centrais da União Europeia (Consilium EU, 2025).
A Bósnia-Herzegovina apresentou seu pedido de adesão em fevereiro de 2016 e obteve o Estatuto de país candidato em dezembro de 2022. Embora as negociações ainda não tenham sido iniciadas, em março de 2024, o Conselho Europeu aprovou sua abertura, condicionando-a à implementação de reformas adicionais. No entanto, o país enfrenta sérias disfunções institucionais, especialmente o impasse entre bosníacos, croatas e sérvios, o que dificulta o consenso necessário para realizar as reformas constitucionais e eleitorais exigidas pela União Europeia (Consilium EU, 2025).
Montenegro propôs a adesão em dezembro de 2008, conquistou o Estatuto do país candidato em dezembro de 2010 e as negociações para a sua adesão iniciaram em junho de 2012. Após abrir 33 dos 35 capítulos de negociação, encerrou provisoriamente três capítulos em dezembro de 2024. Apesar de ser o país mais avançado nas negociações, há preocupações com corrupção, liberdade de imprensa e polarização política, além da falta de progresso no encerramento definitivo dos capítulos de negociação (Consilium EU, 2025).
A Macedônia do Norte submeteu o pedido de adesão em março de 2004 e foi reconhecido como país candidato em dezembro de 2005. O país teve sua primeira participação em uma conferência intergovernamental em julho de 2022. Além disso, a nação aguarda a conclusão de emendas constitucionais para avançar nas negociações. Esse aguardo se dá por conta da disputa com a Bulgária sobre identidade nacional, idioma e questões históricas, bloqueando os avanços (Consilium EU, 2025).
A Sérvia formalizou sua solicitação de adesão em dezembro de 2009, recebeu o status de país candidato em março de 2012 e teve início às negociações de adesão em janeiro de 2014. O país é incentivado a acelerar reformas, especialmente no Estado de Direito. Seu principal entrave é a relação com o Kosovo, cuja independência não é reconhecida por Belgrado, assim tendo uma forte pressão da UE para normalizar o diálogo entre os países (Consilium EU, 2025).
O Kosovo ainda possui uma situação complexa devido à falta de reconhecimento por todos os Estados-Membros, o que impede o avanço formal do processo de adesão. Atualmente o país é considerado um país potencialmente candidato e teve seu pedido apresentado em dezembro de 2022.
Diante desse cenário, podemos analisar que entre os países que estão passando pelo o processo de adesão, Montenegro é o país que parece estar mais próximo de se tornar um membro da União Europeia, sendo estimado que até o final de 2026, o Estado tenha fechado todos os capítulos de sua negociação de adesão à União Europeia.
Portanto, a adesão dos países dos Bálcãs Ocidentais à União Europeia representa um processo complexo, repleto de desafios institucionais, políticos e sociais, mas também carregado de possibilidades de transformação e integração regional. A análise dos critérios de Copenhague e das etapas do processo de adesão evidencia a rigidez e a exigência do bloco europeu quanto ao alinhamento democrático, jurídico e econômico. Observa-se que, embora todos os países da região compartilhem o objetivo de integrar-se à UE, seus avanços são desiguais, condicionados por fatores internos, como instabilidade política, corrupção e disputas étnicas, bem como por entraves externos, como o reconhecimento internacional e os interesses geopolíticos da própria União. Montenegro destaca-se como o candidato mais próximo da adesão plena, mas ainda precisa superar questões estruturais. A integração dos Bálcãs Ocidentais permanece como prioridade estratégica da UE, que busca garantir estabilidade, segurança e desenvolvimento em sua vizinhança. O aprofundamento das reformas e o cumprimento dos critérios exigidos serão fundamentais para o êxito do processo.
Referências Bibliográficas:
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